A História do FREVO


Dança instrumental, marcha em tempo binário e andamento rapidíssimo. Assim o ensaísta Mário de Andrade sumariza o frevo em seu Dicionário Musical Brasileiro (Editora Itatiaia, reedição, 1989). Derivado da polca marcial, inicialmente chamado "marcha nortista" ou "marcha pernambucana", o frevo dos primórdios trazia capoeiristas à frente do cortejo. Das gingas e rasteiras que eles usavam para abrir caminho teria nascido o passo, que também lembra as czardas russas. Até as sombrinhas coloridas seriam uma estilização das utilizadas inicialmente como armas de defesa dos passistas. De instrumental, o gênero ganhou letra no frevo canção e saiu do âmbito pernambucano para tomar o país. Basta dizer que O Teu Cabelo Não Nega, de 1932, considerada a composição que fixou o estilo da marchinha carnavalesca carioca, é na verdade uma adaptação do compositor Lamartine Babo do frevo Mulata, dos pernambucanos Irmãos Valença. A primeira gravação com o nome do gênero foi o Frevo Pernambucano (Luperce Miranda/ Oswaldo Santiago) lançada por Francisco Alves no final de 1930. Um ano depois, Vamo se Acabá, de Nelson Ferreira pela Orquestra Guanabara recebia a classificação de frevo. Dois anos antes, ainda com o codinome de "marcha nortista", saía do forno o pioneiro Não Puxa Maroca (Nelson Ferreira) pela orquestra Victor Brasileira comandada por Pixinguinha.

Ases da era de ouro do rádio como Almirante (numa adaptação do clássico Vassourinhas), Mário Reis (É de Amargar, de Capiba), Carlos Galhardo (Morena da Sapucaia, O Teu Lencinho, Vamos Cair no Frevo), Linda Batista (Criado com Vó), Nelson Gonçalves (Quando é Noite de Lua), Cyro Monteiro (Linda Flor da Madrugada), Dircinha Batista (Não é Vantagem), Gilberto Alves (Não Sou Eu Que Caio Lá, Não Faltava Mais Nada, Feitiço), Carmélia Alves (É de Maroca) incorporaram frevos a seus repertórios. Em 1950, inspirados na energia do frevo pernambucano, a bordo de uma pequena fobica, dedilhando um cepo de madeira eletrificado, os músicos Dodô & Osmar fincavam as bases do trio elétrico baiano que se tornaria conhecido em todo o país a partir de 1979, quando Caetano Veloso documentou o fenômeno em seu Atrás do Trio Elétrico.

Invasão no carnaval
Em 1957, o frevo Evocação No. 1, de Nelson Ferreira, gravado pelo Bloco Batutas de São José (o chamado frevo de bloco) invadiria o carnaval carioca derrotando a marchinha e o samba. O lançamento era da gravadora local, Mocambo, que se destacaria no registro de inúmeros frevos e em especial a obra de seus dois maiores compositores, Nelson (Heráclito Alves) Ferreira (1902-1976) e Capiba (Lourenço da Fonseca Barbosa, 1904-1997). Além de prosseguir até o número 7 da série Evocação, Nelson Ferreira teve êxitos como o frevo Veneza Brasileira, gravado pela sambista Aracy de Almeida e outros como No Passo, Carnaval da Vitória, Dedé, O Dia Vem Raiando, Borboleta Não É Ave, Frevo da Saudade. A exemplo de Nelson, Capiba também teve sucessos em outros estilos como o clássico samba canção Maria Bethânia gravado por Nelson Gonçalves em 1943, que inspiraria o nome da cantora. Depois do referido É de Amargar, de 1934, primeiro lugar no concurso do Diário de Pernambuco, Capiba emplacou Manda Embora Essa Tristeza (Aracy de Almeida, 1936), e vários outros frevos que seriam regravados pelas gerações seguintes como De Chapéu de Sol Aberto, Tenho uma Coisa pra lhe Dizer, Quem Vai pra Farol É o Bonde de Olinda, Linda Flor da Madrugada, A Pisada É Essa, Gosto de Te Ver Cantando.

Cantores como Claudionor Germano e Expedito Baracho se transformariam em especialistas no ramo. Um dos principais autores do samba-canção de fossa, Antônio Maria (Araújo de Morais, 1921-1964) não negou suas origens pernambucanas na série de frevos (do número 1 ao 3) que dedicou ao Recife natal. O gênero esfuziante sensibilizou mesmo a intimista bossa nova. De Tom Jobim e Vinicius de Moraes (Frevo) a Marcos e Paulo Sérgio Valle (Pelas Ruas do Recife) e Edu Lobo (No Cordão da Saideira) todos investiram no (com)passo acelerado que também contagiou Gilberto Gil a municiar de guitarras seu Frevo Rasgadoem plena erupção tropicalista.

A baiana Gal Costa misturou frevo, dobrado e tintura funk (do arranjador Lincoln Olivetti) num de seus maiores sucessos, Festa do Interior (Moraes Moreira/ Abel Silva) e a safra nordestina posterior não deixou a sombrinha cair. O pernambucano Carlos Fernando, autor do explosivo Banho de Cheiro, sucesso da paraibana Elba Ramalho, organizou uma série de discos intitulada Asas da América a partir do começo dos 80. Botou uma seleção de estrelas para frevar: de Chico Buarque, Alcione, Lulu Santos e Gilberto Gil a Jackson do Pandeiro, Elba e Zé Ramalho, Geraldo Azevedo, Fagner e Alceu Valença. Entre os citados, Alceu, Zé e Geraldo mais o Quinteto Violado, Lenine, o armorial Antonio Nóbrega e autores como J. Michiles, mantêm no ponto de fervura o frevo pernambucano. Mesmo competindo com os decibéis – e o poder de sedução – do congênere baiano.

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